Esse é o trecho de uma atividade que preparei há alguns anos, quando ainda trabalhava no núcleo de Educação de Adultos da Faculdadade de Educação da USP. Os textos apresentam nível difícil, mas quem insistir em entender vai perceber as semelhanças existentes entre um e outro. Se é verdade que esse exercício de comparação não serve mais em termos didáticos, pelo menos serve para mostrar porque Machado de Assis é atualíssimo e, portanto, fica justificada a afirmação de que é um autor clássico.
Texto 1: Ler o fragmento abaixo, extraído da obra Quincas Borba (1891), de Machado de Assis:
" - Não há morte. O encontro de duas expansões , ou a expansão de duas formas, pode determinar a supressão de uma delas; mas, rigorosamente, não há morte, há vida, porque a supressão de uma é a condição de sobrevivência da outra, e a destruição não atinge o princípio universal e comum. Daí o caráter conservador e benéfico da guerra. Supõe tu um campo de batatas e duas tribos famintas. As batatas apenas chegam para alimentar uma das tribos, que assim adquire forças para transpor a montanha e ir à outra vertente, onde há batatas em abundância; mas, se as duas tribos dividirem em paz as batatas do campo, não chegam a nutrir-se suficientemente e morrem de inanição. A paz, nesse caso, é a destruição; a guerra é a conservação. Uma das tribos extermina a outra e recolhe os despojos. Daí a alegria da vitória, os hinos, aclamações, recompensas públicas e todos os demais efeitos das ações bélicas. Se a guerra não fosse isso, tais demonstrações não chegariam a dar-se, pelo motivo real de que o homem só comemora e ama o que lhe é aprazível ou vantajoso, e pelo motivo racional de que nenhuma pessoa canoniza uma ação que virtualmente a destrói. Ao vencido, ódio ou compaixão; ao vencedor, as batatas."
Machado de Assis (Joaquim Maria M. de A.), jornalista, contista, cronista, romancista, poeta e teatrólogo, nasceu no Rio de Janeiro, RJ, em 21 de junho de 1839, e faleceu também no Rio de Janeiro, em 29 de setembro de 1908.
Vocabulário
Supressão: corte; eliminação; desaparecimento.
Transpor: ultrapassar; passar além.
Vertente: declive de montanha.
Inanição: enfraquecimento; debilidade.
Despojo: resto; fragmento
Aprazível: que dá prazer.
Canonizar: declarar santo.
Texto 2
"Anuncia-se a guerra na mídia como se o mundo, ou melhor, o Oriente Médio fosse o palco onde se desenrolará o maior reality show da esfera terrestre. O secretário de Estado norte-americano, Colin Powel, atualmente um dos homens mais televisionados do mundo, declara, em um dos pronunciamentos, que os Estados Unidos já possuem um plano para a exploração do petróleo no Iraque. Ninguém mais duvida de que Saddam Hussein nunca foi a razão principal do conflito, mas, de novo, a maior potência do Ocidente deseja controlar a exploração do petróleo. Por causa do “ouro negro”, o número de soldados que já estão ocupando países em torno do Iraque equivale à população de uma cidade média do Estado de São Paulo, 150 mil pessoas.
Os Estados Unidos da América arrogam-se o papel de guardiães da paz, cujo desempenho quase sempre se fez pelo paradoxo da guerra. [...] A paz que se alicerça na guerra é uma falácia. Somente não o é para as empresas americanas que exploram petróleo, que, segundo o Secretário de Estado, já contam com a garantia de participar do controle do petróleo iraquiano. Da mesma forma, ganha a indústria armamentista, cujo capital cresce proporcionalmente ao número de vítimas." (Correio Popular - Opinião - 14/2/2003)
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