quinta-feira, 7 de maio de 2009


As Aventuras de Frajola sem Piu-piu ou... água mole em pedra dura ou... um sonho de liberdade

(Título à escolha)


Vieram os dois: Pretusko e Frajola.

Pretusko, gato preto, que depois nós descobrimos que na verdade é um gato rajado disfarçado de preto. Frajola foi assim chamado por causa da semelhança com o gato do desenho, obviamente.

Pretusko ficou com a Sil, talvez para tentar preencher o espaço vazio deixado pelo meigo Bóris Gatão, o meu gato da Silvia mais amado.

O Frajola veio comigo. Fazer companhia para a minha mãe foi a desculpa que usei para o meu pai aceitá-lo. Desde o primeiro dia em que o vi já pensei: "esse vai me dar trabalho". A curiosidade típica dos gatos, nele toma proporções de leão.

Veio para a casa dos meus pais. Primeiro foi o portão, ou melhor, os portões da frente. Ele queria passear e explorar a rua de qualquer jeito. Pulou uma vez, fomos buscá-lo na casa de um vizinho da frente. De novo pulou o portão, mas desta vez o problema foi que ele simplesmente parou e sentou no meio da rua. Ficou lá olhando para o nada, como que encantado com a novidade do mundão que ele via infinito a sua frente. Mas o risco de atropelamento era latente. Alguém foi correndo e o resgatou antes que algum carro doido descesse a ladeira e transformasse o lindo filhote em uma doce lembrança. Nisso, o medo tomou conta de todos nós em casa e telas preencheram os portões para impedir que o bichano nos desse mais um susto.

Era evidente que ele não estava pronto.

Depois, veio o muro baixo que dá para o telhado do vizinho da esquerda. Subiu a primeira vez, passeou, cheirou o telhado, sentou e contemplou a visão de lá de cima. Mais uma vez o mundo se mostrava infinito e pronto para ser explorado. E nós, preocupados, pensávamos: "se ele for, ele volta". Beleza. Curiosíssimo para o nosso desespero, ele não resistiu e pulou para outro telhado e outro telhado e outro telhado. Ganhou a rua.

Eu não gostava da ideia de ele sair por aí, correndo risco de atropelamentos, de maus tratos daqueles que não entendem a alma felina. "Ele foi, mas ele volta", mais alguém comentou. " Se ele sabe ir, sabe voltar", outro completou. Pois é, o dia inteiro passou e nada dele aparecer. O desespero tomou conta de nós.

Saíram a minha mãe e o meu pai em seu encalço na rua. Alguém disse a minha mãe que ele estava escondido num boteco aqui perto.Meu pai chegou lá já em tempo de o dono do bar lhe dar uma paulada, com o intuito de expulsá-lo do estabelecimento. O bichano passara o dia inteiro escondido lá dentro, assustado, encolhido, com medo da rua e da ameaça das pauladas.

Meu pai o trouxe de volta para casa e telas preencheram o muro que dá para o telhado do vizinho da esquerda.

Ele ainda não estava pronto.

Depois veio o muro do vizinho do lado direito, que dá para a casa desse vizinho e para a laje da casa dos meus pais. Oh bichinho insistente!! A descoberta desse muro quase lhe custou a terceira vida, já que havia perdido as duas primeiras nas aventuras anteriores. O inquieto felino não se contentou em passear pelo muro do vizinho, passou para a varanda e pulou o muro do vizinho do vizinho. O problema é que nessa casa mora um cachorro com fama de trucidar qualquer outro animal desavisado que por infelicidade venha invadir seu território.

Mais uma operação de resgate foi montada porque mais uma vez percebemos que ele sabia ir, mas não sabia voltar. Depois de se assustar com os latidos da fera, ele, não sei como, foi parar no portão da frente da casa desse vizinho, uma parte que o cão anti-social não tem acesso porque fica preso no quintal, graças a Deus, e aí foi fácil puxá-lo para fora e trazê-lo de volta para casa. Nem preciso dizer: uma nova tela, meio improvisada, cobriu uma parte da passagem que dá para a casa do vizinho do lado direito.

Mais uma vez ele não estava pronto.

"Bom, agora se ele tentar escapar, não há o que fazer", dissemos todos. Mas sua inquietação felina não o deixava em paz. Mesmo com nós todos tentando protegê-lo dele mesmo, lá se foi em nova tentativa de ganhar o mundo. Assim , como verdadeiro gato-aranha, começou a escalar a tela do muro que dá para o telhado do vizinho do lado esquerdo, aquele da aventura que quase resultou em "atirei o pau no gato". Escalou e foi parar no telhado: "agora não tem mais o que fazer mesmo", concluímos. Ele saiu. Passeou pelo telhado, descobriu o passarinho da vizinha dentro da gaiola, e ficou um tempo encenando Frajola e Piu-piu. Passou para o telhado do outro vizinho, até sumir da nossa vista. deixamos ele ir. " Já que ele aprendeu a ir, então que aprenda a voltar', foi o meu comentário da vez.

Mais ou menos uma hora depois, ele estava de volta, sem que soubéssemos por onde havia retornado. Miou alto e esfregou-se nas nossas pernas, como a saber que éramos nós os seus verdadeiros amigos, talvez os únicos com os quais poderia contar sempre.

Finalmente ele estava pronto...

porque aprendeu que ser livre não é poder ir para onde quiser e fazer o que quiser; ser livre é ter consciência dos próprios limites; é saber até onde se pode chegar com a segurança de que todo o caminho foi devidamente sinalizado para saber retornar caso se queira ou se precise.

A verdadeira liberdade não é a do ir e vir, e sim a do SABER ir e vir.


PS.: Ele aprendeu ou fui eu que aprendi com ele?

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