Chego da escola num estresse indesejável. O mau-humor está impregnado em mim. Penso: preciso de algo que me faça rir. O riso dissipa o mau-humor. O riso espontâneo, aquele que só uma criança sabe como dar. O riso dissipa o mau-humor. Mas acho que não estava só mal-humorada. Me senti como me sentia o ano passado: como se todos o problemas das pessoas estivessem nas minhas mãos e elas quisessem que eu, somente eu, os resolvesse. A mesma impotência, a mesma sensação de insegurança seguida de raiva, angústia atroz.
A Sil, pegada numa dor de garganta, estava ensimesmada, assistindo a mais um viciante capítulo do BBB em noite de paredão. Eu quieta, porque se disser algo não será com delicadeza, e ela não tem culpa se o peso que carrego está insustentável nesse momento.
Vou me deitar e só consigo pensar no que não devo pensar. Rolo na cama, desrolo na cama. Resolvo me levantar, ir para a sala e ler um livro. O livro me distrai, mas não me faz rir, como inicialmente desejava, até porque não era para fazer rir mesmo: o livro é um relato de um ex-prisioneiro do holocausto. Mesmo assim, o relato me distrai e, por um momento, faz com que eu agradeça pelo que tenho, pelo que sou, já que o sofrimento testemunhado pelo autor parece cruel demais para estar relacionado a seres humanos.
Finalmente me sinto cansada o suficiente para ir para a cama, deitar e dormir. Pisando em ovos para não acordar a Sil, que tem um sono muito leve, entro no quarto e me deito. Não demora muito e adormeço. Uma parte do sono é alívio, outra parte é delírio, e eu acordo de manhã com a sensação de que não dormi o suficiente.
Outras noites assim virão?